Às leitoras e aos leitores...

O intuito deste blog é facilitar a comunicação, fazendo circular a informação e promovendo conexões de idéias e pessoas que se interessam pela capoeira angola.
As opiniões são pessoais e, portanto, de minha inteira responsabilidade, não correspondendo necessariamente a qualquer posição oficial do Grupo Nzinga.
Peço licença às mestras e mestres, de hoje e de sempre, para humildemente participar nessa roda. Sou um aprendiz. Procurarei mantê-lo atualizado e espero que seja de algum jeito útil.
Um abraço!

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Tempo


"Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo..."
Caetano Veloso, em "Oração ao tempo"


Quanto tempo é necessário para se tornar um mestre de capoeira angola?
Quanto tempo deve durar uma roda de capoeira?
E um golpe?!
Tempo é um dos inquices, uma das divindidades, do panteão do candomblé de angola.
Também é chamado de Kitembo.
Acredito que não tenha correspondente nos cultos das vertentes iorubá e jeje.
Pelo que aprendi, rege os ritmos e ciclos da vida: as estações do ano, o clima, as colheitas, a reprodução, os ventos e tempestades, o dia e a noite, a lua e o sol, o envelhecimento, a morte.
Pedro Abib, aluno do Mestre João Pequeno, fala um pouco sobre a noção africana de tempo em seu livro "Capoeira Angola: cultura popular e o jogo dos saberes na roda".
A cultura ocidental tem um apego imenso ao presente, enquanto que na perspectiva africana o passado não morre. Vive no presente e se projeta para o futuro, como uma luz sobre o caminho.
Ou seja, o tempo não é uma linha reta e sim uma espiral, um movimento circular. O hoje está prenhe de ontem, de modo que o que se passou renasce a todo momento.
Essa circularidade do tempo tem representação, por exemplo, no cosmograma kongo, na imagem da serpente que morde a própria cauda, e na idéia de sankofa.
Na capoeira angola, não seria a constante lembrança das "voltas que o mundo dá" parte dessa visão?
Sem falar em vários outros elementos em que a referência circular é fundamental, a começar da própria roda!
Aliás, vale lembrar que na África, o berimbau também serve para promover a comunicação com os mortos, os ancestrais. Será daí que vem a sua incrível força?
Seja como for, guardo comigo a lição de que a contagem mecânica, puramente cronológica do tempo é uma simplificação. Talvez devêssemos falar em tempos, no plural.
Voltando ao começo deste post, como decretar o tempo, quiçá em meses ou anos, necessário para alguém se tornar um mestre?
Ninguém diz, mas mesmo assim sabemos que há um tempo certo, que etapas devem ser cumpridas, que os degraus não podem ser maiores do que as pernas.
Enfim, que Kitembo é soberano.