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quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Filosofia banto

Na década de 30 do século passado, um missionário belga chamado Placide Tempels viveu 29 anos em missão no então Congo Belga, hoje a República Democrática do Congo.

Em contato com as populações residentes na bacia do rio Congo, ele escreveu "A filosofia banto" (La philosophie bantoue), publicado em 1949. Este livro é tão influente quanto polêmico.

O propósito de Tempels era entender o modo que esses povos pensavam e viam o mundo, principalmente sob o ponto de vista religioso. No entanto, muitos criticam o fato de que ele fez uma generalização, para todos os povos banto, de uma experiência restrita. Além disso, seu ponto de vista sempre foi o de um evangelizador cristão, com todos os preconceitos que isso significa.

Seja como for, feitas as devidas ressalvas, seu trabalho ainda é considerado fundamental para quem se interessa por filosofia africana.

Nei Lopes, em sua "Enciclopédia brasileira da diáspora africana", faz um resumo dos princípios básicos do livro:

1) o fundamento do universo e seu valor supremo é a vida e a força que a impulsiona e dela emana;

2) todos os seres devem ser entendidos como forças e não como entidades estáticas;

3) em qualquer circunstância, deve-se sempre procurar acrescentar força à vida e ao universo e evitar sua diminuição;

4) ocorrendo essa diminuição, deve-se buscar a intervenção dos adivinhos e ritualistas, porque eles conhecem as palavras que reforçam a vida;

5) a morte é um estado de diminuição do ser; mas os descendentes vivos de um defunto podem, através de oferendas, transmitir a ele ainda um pouco de vida: o morto sem descendentes está condenado a uma morte definitiva;

6) um indivíduo se define por seu nome: ele é o seu nome; e este é algo exclusivo e íntimo, indicativo de sua individualidade dentro do grupo a que pertence; e

7) todo ser humano constitui um elo vivo na cadeia das forças vitais: um elo ativo e passivo, ligado em cima aos elos de sua linhagem ascendente e sustentando, abaixo de si, a linhagem de sua descendência.

Essa energia vital é o que costumamos chamar de Ngunzo.

Através dela, todos os seres, vivos ou mortos, se inter-relacionam e influenciam. Há ações de forças que tendem a diminuir a energia vital e outras que a aumentam, fazendo interagir harmonicamente todas as forças que Nzambi criou e colocou à disposição do homem.

É isso.

5 comentários:

  1. "Ngolo e Ngunzo, força e poder..."

    Salve Haroldo !
    Estou conectado na energia das suas palavras !

    ;)

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  2. Nessa questao da filosofia Bantu, vale tambem ver a obra de Henri Junod, um sui'co que viveu na Africa Austral, em missao crista tambem.

    Ele tem um livro muito legal, chamado "Usos e costumes dos Bantu", que descreve desde coisas cotidianas ate reflexoes que presenciou entre os nativos (sic).

    Ali se apanha, por exemplo, a descricao do Xitende, que (me parece), e primo, irmao mais velho, ou pai do berimbau. Esse instrumento ainda e tocado nas bandas ca de Mocambique. O principio e o mesmo do Berimbau: cabaca, arame, verga. Mas a cabaca fica no meio, e toca-se usando um dedo como dobrao.

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  3. Me pareceu mais uma Teologia do que Filosofia, propriamente dita. Mas parecebéns pela postagem, creio que é um bom começo para um estudo de filosofia africana.

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  4. Caro Anônimo, creio que a distinção não é tão simples assim. São Tomás de Aquino e Santo Agostinho fazim filosofia ou teologia? A profunda base mitológica e mística da produção de pensadores como Platão e Aristóteles faz deles teólogos e não filósofos? O trabalho de Tempels constuma ser enquadrado no que se chama de etnofilosofia, uma abordagem que assume que a visão dominante na filosofia ocidental, racionalista e individualista e reflexiva, não é necessariamente a única válida. Ao contrário e mais ainda, parte-se do pressuposto de que idéias que buscam responder e colocar perguntas filosóficas (quem somos? por que somos? o que é certo? e errado? etc. etc.) estão presentes na cultura, tradições, mitologias e, também, claro, religiões dos povos.
    Por outro lado, por sua linha de raciocínio, corre-se o risco de concluir que povos que não expõem ou expuseram seu pensamento de forma escrita e segundo as regras da lógica formal sejam desprovidos de filosofia, ou de inquietação e especulação filosófica.
    Um abraço!

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